oiê!
uma nova era... já mudada
em dezembro, prometi que enviaria um conto gratuito por mês para você.
bom, já mudei isso kkkk
mas é porque decidi compartilhar o primeiro capítulo de Sempre Teremos Lisboa gratuitamente!
em fevereiro, volto com a programação original, de compartilhar histórias inéditas.
por enquanto, fique com um pedaço do meu mais recentemente lançamento.
boa leitura!
01 - você tem um sonho? que pena
O problema de ter sonhos é que eles nem sempre se realizam da maneira como esperávamos. Eu descobri que o maior sonho da minha vida estava fadado ao fracasso no momento em que saí da área de desembarque do aeroporto de Lisboa.
Quando vi meu nome estampado em um cartaz, não fiquei realmente surpresa ao perceber que não era minha mãe quem o segurava.
Decepcionada? Sim.
Mas o pior de tudo era que eu nem podia culpá-la. Renata Correia havia me enviado um e-mail dizendo que não poderia estar presente para me receber e que mandaria outra pessoa em seu lugar.
Típico.
Mais típico ainda era ter uma parte de mim que esperava vê-la ali. Que o e mail fosse só um meio de me despistar e que, na verdade, ela havia preparado uma surpresa. Às vezes, os sonhos te deixam cega.
Meu pai nunca falaria isso na minha cara, mas eu praticamente podia ouvi lo conversando com a minha avó Marcinha, há oito mil quilômetros de distância. Eu sabia que isso ia acontecer. Era melhor que a Nanda nem tivesse ido.
Não pude evitar: dei uma olhada ao redor, ignorando a garota que segurava a placa – amarela, com meu nome escrito em uma caligrafia bonita, feita em tinta preta, decorada com glitter e lantejoulas – com uma mão e acenava
para mim com a outra. Quem sabe minha mãe não havia mudado de ideia? Talvez ela tivesse encontrado um tempo para me ver…
A decepção se assentou em meu estômago com ainda mais força e pude sentir um gosto ácido queimando em minha língua. Engoli em seco, segurando o choro.
— Ei! Ananda! — a garota chamou, agora dando pulinhos. Como se eu não pudesse vê-la.
Outro passageiro trombou em mim e disse algo em uma língua que eu não conhecia, mas obviamente era um xingamento. Eu estava parada no meio do fluxo de pessoas, afinal.
— Aqui! Oi! — ela continuou gritando, empurrando outras pessoas que esperavam pelos seus entes queridos para o lado, para poder ficar bem em frente à grade que separava o saguão do aeroporto da área de desembarque.
Com um suspiro, fui até ela, notando que parecia ter a minha idade – talvez fosse só um ou dois anos mais velha. Seus cabelos castanhos estavam cortados em um estilo “joãozinho”, e havia um lenço amarelo amarrado sobre eles.
— Muito prazer em te conhecer e tudo mais, mas a gente precisa ir — ela foi falando, assim que me aproximei. Sem eu pedir, pegou a mala de rodinhas da minha mão e começou a caminhar para fora do aeroporto. — Estacionei em lugar proibido, porque achei que você seria mais rápida. Vamos, vamos.
Ela literalmente me empurrou para fora. Não houve sequer um “Oi, tudo bem? Meu nome é Fulana De Tal e sua mãe mandou dizer que sente muito por não estar aqui, mas ela te ama e está te esperando em casa”. Ok, talvez a última parte não acontecesse mesmo, mas a educação ficou com Deus, né?
Seguimos até um carro pequeno de duas portas, que parecia uma abelha, pois era todo amarelo (eu estava ficando enjoada de tanto amarelo ao redor daquela menina). Eu mal tive tempo de notar a onda de calor que fazia minha nuca suar, porque a garota abriu o porta-malas e jogou minha mala ali como se não fosse – ou pesasse – nada. Os 23kg permitidos pela
companhia aérea não passavam de plumas para ela? Eu mesma sofri para tirar a mala da esteira…
Reclamei alto, falando para ela tomar cuidado pois tinham coisas que podiam quebrar ali dentro, mas ela nem me ouviu. Já havia fechado o porta malas com um baque e se dirigia para o lado do motorista.
— Ah, visse? — falou, tirando um papel do para-brisa e agitando-o em minha direção. — Você ficou enrolando e agora eu tomei multa. Muito obrigada. — Seu tom foi de pura ironia.
— Eu não tenho culpa se a fila da imigração estava cheia. — Encolhi os ombros, entrando no carro logo em seguida.
Por dentro ele era menor do que parecia por fora. Meus joelhos batiam no painel e a garota mal cabia entre o banco e o volante. Claramente ela estava acostumada com a falta de espaço, porque se encaixou sem bater o cotovelo na porta enquanto prendia o cinto de segurança – ao contrário de mim, que em breve teria um roxo no braço.
— Entrega isso para sua mãe, sim? — E me passou o papel sem olhar em minha direção.
Uma parte de mim queria rasgar a multa em um milhão de pedacinhos, mas me fiz de boa filha e o guardei no bolso da frente da minha mochila. Depois, não pensei mais nisso, porque a garota saiu cantando pneus do estacionamento e eu me arrependi amargamente de ter entrado naquele carro sem ao menos ter questionado quem era ela.
Segurei com força na alça acima da janela, que meu pai carinhosamente chamava de “puta-que-pariu”. Pela primeira vez na minha vida entendi o que ele queria dizer. Enquanto costurávamos o trânsito, quase batendo em carros e praticamente subindo na calçada em algumas curvas, minha vontade era de xingar o tempo todo.
Percebendo meu desconforto, ela riu, tirando os olhos da rua por alguns segundos.
— Tá com medo, é?
— Cuidado com aqueles dois ônibus! — gritei, me encolhendo no banco ao prever a batida.
Mas ela foi ágil e passou entre os dois veículos sem nenhum arranhão antes que eles a fechassem. Só pude ouvir as buzinas dos motoristas e o que pareceram xingamentos em um sotaque português carregado.
Foi só ali que eu percebi.
— Você é brasileira!
Notei um sorriso de canto se formar em seu rosto. Dessa vez, felizmente, ela manteve a atenção no trânsito.
— Nascida e criada em Recife, mas vim para cá faz uns dois anos para estudar.
Ela cutucou o piercing de argola prata em seu nariz quando paramos em um sinal vermelho. Se virou para mim e notei que seus olhos eram de um castanho escuro, com pequenas manchas douradas perto da íris.
— E você? Animada para passar um tempo com a sua mãe?
— Ah. Você sabe de tudo mesmo, né? — Soltei uma risada baixa, tentando fazer piada. A garota simplesmente ergueu a sobrancelha, como se não tivesse entendido o que eu quis dizer.
O que eu devia ter perguntado naquela hora era quem era ela. Mas não o fiz.
Porque pensei que eu deveria estar animada. Deveria estar pulando de excitação no banco do carro, assim como estive no avião – eu mal dormi, não consegui me concentrar em nenhum filme, nem toquei no jantar. Deveria estar pensando nas coisas incríveis que faríamos enquanto eu estivesse em Lisboa, ao mesmo tempo que encarava, com olhos arregalados, a paisagem do lado de fora, absorvendo tudo através da janela do carro. Eu tinha uma lista de coisas que eu queria ver em Portugal, e todas envolviam a companhia da minha mãe.
Mas…
— Sim, estou. — Abri um sorriso, torcendo para não parecer super forçado.
Não pela primeira vez, me perguntei que compromisso era mais importante do que ver sua própria filha. Uma filha que ela não via pessoalmente há
mais de uma década, diga-se de passagem. Será que eu realmente não valia um esforço?
Tentei não pensar mais nisso. Tive muito tempo para me martirizar no avião. Eu já estava ali, em Portugal, e as coisas iam mudar. Era no que eu precisava acreditar.
A garota ergueu uma sobrancelha, como se pudesse ler a verdade em minha expressão. Pensei que fosse falar alguma coisa, mas o sinal abriu naquela hora e ela tornou a acelerar.
Seguimos o resto do caminho em silêncio, comigo ainda xingando mentalmente toda vez que ela dava uma freada muito brusca, até que estacionamos em frente a um prédio com a fachada de azulejos azuis. Saí do carro me perguntando se eu deveria pagá-la, dar alguma gorjeta, ou se minha mãe tinha cuidado de tudo. Mas, como no aeroporto, a garota foi mais rápida. Já havia saltado do carro, aberto o porta-malas, colocado minha mala no chão e se dirigido ao lado do motorista mais uma vez. Queria perguntar o porquê de tanta pressa, mas, enquanto ela gritava “tchau” e acelerava o carro, tudo o que consegui perguntar foi:
— Qual o seu nome?
— Glória — respondeu, acenando com a mão para fora da janela enquanto desaparecia no trânsito.
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um grande abraço,
julia